quarta-feira, 21 de fevereiro de 2007

Não podemos dar tudo a todos e muito menos ao mesmo tempo


Já que só alguns têm acesso ao TEMPO de MEDICINA, aqui fica uma artigo interessante.


Reforma «incendiou» debate sobre USF
A constituição das USF e a reorganização dos centros de saúde foram debatidas em clima de polémica na Secção Regional do Centro da OM. «Clivagem» entre profissionais, «selvática forma de criar as unidades» e «expectativas vilipendiadas» foram algumas acusações a que Luís Pisco procurou dar resposta.

Foi com uma sala repleta que a Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos recebeu, no passado dia 13, o coordenador da Missão para os Cuidados de Saúde Primários (MCSP), Luís Pisco, para uma sessão subordinada ao tema «Constituição das USF — Êxitos e dificuldades. Reorganização dos centros de saúde — O que está previsto». A moderar o debate, o bastonário, Pedro Nunes, recordou que a Ordem vê esta reforma como um «bom modelo, que reforça o papel dos médicos e dos profissionais na gestão dos cuidados de saúde». No entanto, alertou, o modelo pode sofrer «algumas ameaças, se os poderes políticos não lhe derem o devido sustentáculo, traindo as esperanças dos profissionais que nele investirem, e se não resolverem o problema global do sistema de Saúde». Saudando os responsáveis da MCSP, pelo seu empenho numa reforma que «todos desejamos que seja um êxito», o presidente do Conselho Regional do Centro da OM, José Manuel Silva, dirigiu-se aos colegas que optaram pela solução das USF e que «aproveitaram uma janela de oportunidade para trabalharem da forma que consideram mais recompensadora». Mas não esqueceu os outros colegas que, pelo contrário, «quiseram esperar», e deu uma palavra de ânimo aos que, «pelo progresso da reforma, viram vilipendiadas as suas expectativas no que se refere à progressão da carreira, a colocações e concursos». O anfitrião introduziu a «controvérsia» ao ler a carta de um médico que denunciava «desorganização e conflitos» no seu centro de saúde e considerava «selvática a forma de criar as unidades». Finalmente, apresentou ao coordenador da MCSP uma lista de dezenas de perguntas — «na maioria, de colegas» —, de que são exemplo as seguintes:
Será que a reforma teria de ser feita assim?
Porque é que começou pelas USF e não pela reorganização dos centros de saúde no seu todo?
Porque é que se optou por um caminho que ia provocar graves clivagens e onde alguns já se olham como inimigos?
Porque é que uns têm tudo e outros nada em termos de investimento, informatização e prémios de produtividade?
Desigualdades e cisões Luís Pisco respondeu que a reforma foi pensada e «não podia ter sido feita de outra maneira». À fase inicial da criação de «pequenas equipas autónomas de prestação de cuidados, as USF» — uma mudança feita pelos profissionais, «de baixo para cima», e que já estava prevista na lei dos centros de saúde de terceira geração, desde o tempo da ministra Maria de Belém —, o responsável informou que se seguirá a reorganização dos centros de saúde (CS) na sua globalidade. Assim, do agrupamento dos 360 CS hoje existentes surgirão, depois da extinção das sub-regiões de Saúde, 65 novas estruturas: as unidades locais de cuidados de saúde primários (ULCSP), cujo objectivo principal será criar uma sinergia de gestão. O diploma com esta nova versão de CS, adiantou Luís Pisco, está a ser preparado pela equipa de Coutinho de Abreu, do Instituto de Direito das Empresas e do Trabalho, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. «Teremos uma primeira versão até final de Fevereiro, que será debatida publicamente, e em Março deverá existir uma versão definitiva. Prometemos ao ministro da Saúde que, antes de sairmos — em Abril —, teríamos o decreto-lei pronto a ser aprovado». Luís Pisco reiterou que esta foi a «melhor forma para fazer uma reforma, melhorando a satisfação de profissionais e utilizadores». No que se refere a possíveis clivagens entre equipas das USF e restantes elementos dos CS, geradas pela coexistência de «médicos que têm meios e equipamentos» com «médicos que não os têm», levando a que haja «doentes como diferentes tipos de resposta» — um problema focado pelos clínicos da assistência e pelo próprio bastonário —, o coordenador da MCSP foi claro: «Não podemos dar tudo a todos e muito menos ao mesmo tempo; temos uma reforma para fazer e ela é faseada». Mas o que se pretende, acrescentou, «é que toda a gente tenha as mesmas condições: informatização e sistema de avaliação».A questão da mobilidade dos profissionais que não aderiram às USF também preocupou os clínicos presentes, falando mesmo uma médica de «pessoas que foram enxotadas dos locais onde estavam». A mobilidade dentro do próprio centro de saúde, lembrou Luís Pisco, sempre existiu e está dentro da lei. Alice Oliveira...
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Bastonário reticente em relação às ULCSPJosé Luís Biscaia, coordenador da Unidade de Saúde Familiar de S. Julião, na Figueira da Foz, lamentou que o debate não tivesse sido mais esclarecedor sobre «o novo centro de saúde». No seu entender, as unidades locais de cuidados de saúde primários (ULCSP) virão a integrar «o que de mais nobre há nos centros de saúde, as suas diferentes missões, com mais autonomia e num espaço diferente». Acabam com «as sub-regiões que não funcionam» e são uma «resposta inteligente à tentativa hegemónica do senhor ministro e dos hospitais para fazer unidades locais de saúde».Dissonante, o bastonário avisou que a OM ainda não «sabe bem» o que são estas «65 entidades com autonomia gestionária» e que só depois de esclarecida virá a dar o seu parecer. «Tanto quanto percebi, até aqui havia centros de saúde com pouca autonomia de gestão, mas geridos por um médico. A partir de agora, estarão juntos, criando 65 unidades dirigidas por um presidente». Provavelmente, disse, «a sua característica principal será a nomeação política»....
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Alterações em estudoDe acordo com o coordenador da MCSP, o «agrupar de centros de saúde com gestão comum» far-se-á à semelhança dos hospitais nas já existentes unidades locais de saúde (Matosinhos, por exemplo). As ULCSP — que congregarão USF, centros de saúde e outras unidades operacionais do âmbito dos cuidados primários — terão um presidente e dois vogais, um vocacionado para a direcção clínica e outro para o planeamento e a organização. «Estamos com as cinco ARS a fazer um estudo do que devem ser o perfil e as atribuições destas pessoas e vamos procurar que sejam escolhidas pela sua competência», garantiu Luís Pisco. Pedro Nunes teme que o presidente seja um administrador não médico, tendo como vogais um médico, «que não é necessariamente um especialista em Medicina Geral e Familiar», e um vogal financeiro também administrador. «Isto aproxima-se da gestão hospitalar com os bons resultados a que temos assistido até hoje», reparou o bastonário, sublinhando que esta é a sua «pré-avaliação» e que a da Ordem dos Médicos «surgirá a seu tempo». Gerir ou ser gerido O que fazer aos colegas que não aderiram a nenhuma USF, foi uma das questões colocadas no debate. Luís Pisco lembrou que a USF «é a forma de um conjunto de médicos se organizar dentro de um centro de saúde, fazendo parte dele, como já acontece com algumas extensões de saúde que funcionam de uma forma mais ou menos autónoma». Sublinhando que estas unidades prestadoras de cuidados estão «absolutamente interligadas e dependentes do seu centro de saúde», o médico lembrou que existe um manual de articulação da USF com o seu centro de saúde, que deve ser assinado por coordenador e director, respectivamente, e adiantou que a legislação que sairá em breve «estabelecerá claramente os deveres e as responsabilidades de cada um».Reiterando o carácter voluntário de criação das USF — no debate, alguns médicos haviam sugerido «pressões» —, Luís Pisco sublinhou que «só avança quem quer». «Os colegas que não quiserem, continuam, em bloco, a pertencer ao centro de saúde. Foi dada a oportunidade a quem quisesse avançar primeiro e ter alguma capacidade de autogestão e auto-organização. Os outros estão no direito de não o fazer, ficam onde estão e são geridos». Ao contrário do que tem acontecido até aqui, declarou o responsável, «nós acreditamos na capacidade dos colegas para se auto-organizarem, para se autogerirem e para tomarem responsabilidade sobre um conjunto de tarefas que não precisam que outras pessoas façam por eles».Segundo Luís Pisco, na Missão para os Cuidados de Saúde Primários deram entrada 140 candidaturas a USF, envolvendo mais de dois mil profissionais, 900 dos quais médicos de família. Destas, 70 estão homologadas pelos presidentes das ARS e prestes a entrar em funcionamento, enquanto 48 estão já a funcionar. «Temos USF a trabalhar, as candidaturas continuam a entrar. Estamos a preparar a associação dos actuais centros de saúde em unidades locais de cuidados de saúde primários e a introdução de um novo modelo de gestão, a instituir governação clínica e a reorganizar os serviços de suporte, devido à futura desactivação das sub-regiões de Saúde».

TM 1.º CADERNO de 2007.02.190712321C02107AO07B

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E já agora

Da mesma edição:

"FACTO DA SEMANA
Um pequeno grande artigo de opinião
Esta semana resolvemos destacar um facto que, porventura, terá passado despercebido a muitos. No passado dia 12, o Diário de Notícias publicou, algures no caderno de Economia, e entre outras opiniões, um artigo da professora Manuela Arcanjo. Sim, a ex-ministra da Saúde, que no Governo de António Guterres foi substituída pelo actual tutelador da pasta da Saúde, assina, como professora do ISEG, um artigo de opinião em que não poupa críticas a Correia de Campos. Para a professora de Economia, de formação (e ex-ministra…), o facto de Correia de Campos ter reduzido a comparticipação no custo dos medicamentos, não apostar na melhoria das infra-estruturas dos centros de saúde, não ter reforçado as condições financeiras de incentivo à mobilidade dos profissionais, entre várias outras medidas, parece ter um objectivo — «o de apresentar Portugal como um “estudo de caso” com uma redução da despesa pública!».Se assim não é, pergunta a professora, «aquilo a que se assiste traduz apenas uma visão contabilística da saúde ou terá alguma estratégia inconfessável?».
J.M.A./M.F.T.TM 1.º CADERNO de 2007.02.190712321C26407MF07C

DEPOIS DIGAM-ME QUE SOU ANTI-PS!

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